Provavelmente composta entre 1613-1614, a peça Os Dois Primos Nobres [The Two Noble Kinsmen] contém os últimos escritos de Shakespeare para o teatro, nesse caso em colaboração com John Fletcher, dramaturgo quinze anos mais jovem, e que então ascendia às fileiras da King’s Men, companhia teatral da qual Shakespeare era acionista, ator e dramaturgo. A importante colaboração é atestada já no frontispício da primeira edição do texto da peça, o in-quarto de 1634, onde aparecem juntos os nomes dos autores: John Fletcher and William Shakespeare, Gentlemen. A peça é classificada como tragicomédia, gênero bastante popular, em Londres, na primeira década do século XVII. Ambientada na Grécia Antiga, especificamente, em Tebas, a ação dramatiza o 'Conto do Cavaleiro', narrativa em verso que, já recontada por Geoffrey Chaucer (devidamente anunciado no Prólogo), a partir de La Teseida de Boccaccio, abre o clássico Os Contos de Canterbury. No contexto do amor cortês em que a peça se insere, o conflito central, analogamente às fontes, decorre da inusitada, instantânea e incontrolável paixão de Palamon e Arcite, os dois primos nobres, por uma mesma jovem, Emília, irmã de Hipólita, esta noiva de Teseu. Entre as importantes alterações introduzidas às fontes, destaca-se a criação -- geralmente atribuída a Shakespeare -- da Filha do Carcereiro, personagem cuja loucura decorrente do amor não-correspondido conta com importantes antecedentes na dramaturgia shakespeariana (e.g. Ofélia) e cuja interpretação, mesclando ingenuidade e erotismo, tem fascinado e desafiado atrizes. A exemplo de outras peças shakespearianas tardias, temos aqui as presenças do sobrenatural, da ação ritualizada e dos efeitos cênicos espetaculares. Em meio a momentos de forte tensão erótica, constatamos a dramatização de temas tão fundamentais quanto pungentes: amizade, lealdade, honradez, rivalidade, violência, ódio, amor, paixão, compaixão. É surpreendente que esse texto, elogiado por luminares das Letras (e.g. Thomas de Quincey, Charles Lamb, Coleridge) e cobiçado por atores, embora bem traduzido por Ênio Ramalho, em Portugal, como Os Dois Parentes Nobres, tenha permanecido inédito no Brasil até o advento desta tradução anotada, em versos decassílabos e prosa, que segue, com rigor, as modulações do texto originário.
Sobre os autores(as)
Shakespeare, William
William Shakespeare nasceu em abril de 1564 em Stratford-upon-Avon. Depois de casar-se com Anne Hathaway em 1582 e ter três filhos com ela, William mudou-se para Londres. Em poucos anos, seu nome passou a ser reconhecido no teatro londrino, como ator e como dramaturgo. Foi nesse cenário que ele produziria algumas das mais celebradas peças de todos os tempos, entre elas: Ricardo III (1592), Tito Andrônico (1594), Romeu e Julieta (1595), Sonho de uma Noite de Verão (1595), O Mercador de Veneza (1596), Hamlet (1601), Macbeth (1603), Otelo (1604), Rei Lear (1605) e A Tempestade (1611). Com o tempo, Shakespeare prosperou financeiramente e passou a investir parte de sua riqueza em imóveis de Stratford. Depois de sua aposentadoria do palco, Shakespeare voltou a sua cidade natal, onde morreu em 23 de abril de 1616. |
O'Shea, Jose Roberto
José Roberto O’Shea é bacharel pela Universidade do Texas-El Paso, mestre em Literatura pela American University, D. C. e ph.D. em Literatura Inglesa e Norte Americana pela Universidade da Carolina do Norte-Chapel Hill. Foi professor da Universidade Federal de Santa Catarina entre 1990 e 2016, e segue atuando no Programa de Pós-Graduação em Inglês da universidade. Tem cerca de setenta traduções publicadas, incluindo obras de Harold Bloom, Daniel Defoe, Robert Louis Stevenson, Mark Twain, Joseph Conrad, William Shakespeare, James Joyce, W. H. Auden, Christopher Isherwood, Flannery O’Connor, Philippa Gregory e Kathleen McCracken. |